Neblina

Rodrigo Goldacker
Fazia Poesia
Published in
3 min readOct 8, 2018

--

“tree on green grass field during foggy daytime” by Nicolai Dürbaum on Unsplash

Andamos juntos na saída dos ventres,
Chorando como idênticos rebentos do mundo,
Das lágrimas que jorramos, diferentes conclusões retiramos,
Das conclusões que retiramos, diferentes vidas construímos;

Não há mérito na sorte das consequências
Destas distintas singularidades trilhadas,
Se as feridas de uns trouxeram cicatrizes
E as feridas de outros infeccionaram,
Tudo que há é tragédia, despropósito,
Uma piada de mau gosto,
Diferentes organismos em diferentes ambientes,
Amargor de poesia sem rima num destino sem pudor,
Uma ironia sem jeito de um caminho sem rota;

Tudo que há é um vagar perdido da vida errante
Em que alguns nesta neblina tropeçam em abismos
Enquanto outros acabam por topar com boas saídas;

Não há mapas para seguir dentro deste denso nevoeiro,
Não há julgar para quem não caiu no abismo que não viu,
Nem há prêmio nesta névoa que não venha aleatório,
Nossas lágrimas afundam por rumos diversos na terra
Sem que nossos olhos controlem tais jornadas;

Que tolo seria dar valor ao olho cego
Ou validar um mapa torto de um terreno mutável;

Que tolo seria acreditar que a neblina da vida dissiparia
Com palavras, verdades, certezas, com abismos desenhados nas folhas,
Que tolo seria acreditar na solidez contra a inconsequência do próximo passo
Por conta do último passo ter dado a sorte de não findar-nos;

Que tolo seria julgar que o porvir se assegura pelo já ido
Ou tornar o incerto amanhã reflexo da certeza do ontem,
Que tolo seria buscar seguranças no nevoeiro!

Que tolo, que tolo, que tolo seria
Andar tentando enxergar em um mundo que nada garante,
Que diferença faz na névoa manter olhos abertos ou fechados?
Por que não se render à cor interna?
Por que acreditar mais na névoa externa?
Por que não se jogar de braços abertos?
Por que não viver e sorrir?
Por que buscar a certeza inatingível do próximo passo?
Por que não dar passos por loucura?
Por que não amar o risco dos pés?
Por que não amar a vida, o nevoeiro, a tal cor interna, o abismo e o acaso,
O sucesso e o fracasso,
Por que não amar a sorte cega?

Por que não gritar cantigas ecoando felicidade na neblina?
De certo nenhum mapa isto criaria
Mas daria aos outros perdidos alguma garantia
De que não só abismos trágicos há no terreno,
Mas também sortes dadas aos que pulam sem buscar por aí,
Alguns paraísos perdidos a serem encontrados sem querer;

Então canta, canta, canta!
Sorri e dança, tua vida narra aos ventos,
Faça na neblina ecoar tua alegria!

Uma vez olhei para o céu e o dia estava lindo,
Sol a pino e nuvens de um branco fofo,
Nenhuma certeza tenho de que outros dias bonitos virão,
Mas por que não?

Que bom é cantarmos sobre estes tais belos dias
Para não esquecermos que eles podem existir,
Então canto meu momento para ti,
Com sorriso no rosto e felicidade nas palavras,
Pois nem tudo é mal dentro da névoa,
Sempre é dia de verão em algum canto,
Algum lugar pode vir a ser canto seu eventualmente
E do seu canto poderá ser você também a cantar
Que há alegria nesta vida, há alegria na vida,

O céu é bonito daqui…

Clique em Clap quantas vezes quiser e contribua com nossos poetas.
Siga a Fazia Poesia

--

--