18 de abril — uma tradução de Sylvia Plath, por Laryssa Carreiro

laryssa carreiro
Fazia Poesia
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4 min readAug 9, 2023

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Sylvia Plath Images from Inside The Bell Jar

Sylvia Plath nasceu em Boston, Massachusetts, em 27 de outubro de 1932, onde trilhou os primeiros passos de sua carreira na escrita. Genialmente precoce, publicou o primeiro poema com apenas 8 anos de idade, na seção infantil do jornal Boston Herald, o que se tornou frequente nos anos seguintes.

Ingressou sem dificuldades no Smith College, uma faculdade de artes voltada só para mulheres, em Northampton, Massachusetts. Depois de se destacar como editora da revista interna, foi convidada para editar a revista feminina Mademoiselle, em Nova York, onde permaneceu por um mês — experiência que serviu de inspiração para a narrativa de seu romance A Redoma de Vidro.

Antes mesmo de se formar, Plath já demonstrava na escrita o histórico do que hoje podemos diagnosticar como depressão. Sylvia, após a primeira tentativa documentada de suicídio e de turbulentos tratamentos com eletrochoque, graduou-se e ganhou uma bolsa de estudos para morar na Inglaterra, onde continuou publicando poemas e contos e onde também conheceu o poeta e futuro marido dela, Ted Hughes.

Conhecida pelos escritos confessionais, muitas vezes até brutais, Sylvia é considerada uma das escritoras mais conceituadas no Ocidente por sua narrativa íntima e angustiante, que traduz em versos para a literatura a condição psicológica da depressão, ainda que só tenha alçado esse posto após o suicídio, em 1963.

Suas principais obras são as coletâneas The Colossus and Other Poems (1960, sem tradução em português) e Ariel (1965), além do romance A Redoma de Vidro, publicado logo após sua morte.

O poema traduzido

18 de abril

a lama de todos os meus ontens
apodrece no oco do meu crânio

e se meu estômago se contraísse
por conta de um fenômeno explicável
como gravidez ou constipação

eu esqueceria você

ou esqueceria por conta do sono
infrequente como lua de queijo verde
por conta da comida
nutritiva como pétalas de violeta
esqueceria por conta disso

e em alguns metros fatais de grama
em alguns espaços de céu e árvore

ontem, um futuro foi perdido
tão fácil e irremediavelmente
como uma bola de tênis ao anoitecer

O poema original

April 18

the slime of all my yesterdays
rots in the hollow of my skull

and if my stomach would contract
because of some explicable phenomenon
such as pregnancy or constipation

I would not remember you

or that because of sleep
infrequent as a moon of greencheese
that because of food
nourishing as violet leaves
that because of these

and in a few fatal yards of grass
in a few spaces of sky and treetops

a future was lost yesterday
as easily and irretrievably
as a tennis ball at twilight

A motivação que tive para traduzir esse poema foi a data no título — 18 de abril. Não sei o que é para Plath, mas é a data do meu aniversário.

Como se já não sentisse a escrita dela me inundar com sua melancolia, o acaso, que não costuma falhar, não me deu trégua, e decidi traduzir esse poema não apenas porque ele traz a data de meu aniversário no título, mas também porque o poema trata de temas delicados — que, por incrível que pareça, ainda são pouco falados —, e senti a necessidade de compartilhá-lo, como leitora, tradutora e poeta, para que outras pessoas também tenham a oportunidade de conhecer e interpretar Sylvia Plath por si mesmas.

O poema apresenta características que relatam a morte e a gravidez como um “fenômeno” qualquer, de forma simples e natural, explícita — às vezes, até banal. Ao observar o poema, ela compara a gravidez com uma constipação, “because of some explicable phenomenon/such as pregnancy or constipation”, o que me fez refletir em sua enunciação como uma dor que aparece e, depois de um tempo, desaparece por hábito ou costume.

Entretanto, no início do primeiro verso da segunda estrofe, Plath apresenta a condição “and if”. Neste caso, o enunciado refere-se à terceira parte do poema, “I would not remember you”.

No primeiro verso da última estrofe, Plath cita mais uma vez o tempo passado e imutável que condescende o futuro, “a future was lost yesterday”, que também é onde o poema começa. Ela retoma o primeiro verso do poema, pressupondo-se que um único ontem poderia ter mudado todo o futuro imprevisível.

Essa foi apenas uma das possíveis interpretações de leitura do poema pela reflexão de uma poeta tradutora. A quais outras interpretações você consegue chegar com a leitura do poema traduzido de Sylvia Plath?

Referências
BRITTO, Paulo Henriques. A Tradução Literária. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

Revista Suporter. 18 de abril | Sylvia Plath y la pelota melancólica

Hello Poetry | April 18 by Sylvia Plath

laryssa carreiro (1996) é escritora, poeta, tradutora e educadora, graduada em Letras pela FMU e pós-graduada em Semiótica e Análise do Discurso pela FAMEESP. Integra a equipe de poetas da Fazia Poesia desde fevereiro/2023 e já participou de oficinas de escrita com autoras renomadas da contemporaneidade. Publicou seu primeiro poema na antologia Poesia Ativa, da Absurtos Editora e seu primeiro livro será publicado pelo NADA ∴ Studio Criativo.

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tradutora (inglês), educadora e poeta no @faziapoesia | são paulo/sp @carreirolarys